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sexta-feira, 28 de maio de 2010

Sem culpa na cama, mas...

Sem culpa na cama, mas...
A sexualidade da mulher brasileira virou assunto obrigatório - tão obrigatório que chega a ser entediante (Mary Del Priore)

"Nos lençóis macios, amantes se dão",como na canção de Roberto e Erasmo.Bonito não?Mas foi preciso percorrer um longo caminho para que a brasileira visse os "travesseiros soltos"e as "roupas pelo chão". A ruptura só começou no fim dos anos 60 e se consolidou nos anos 70 e 80. A felicidade conjugal, do ponto de vista feminino, era ser complemento do marido no cotidiano doméstico, dormir de camisola e fazer amor à meia-luz. Nudez total? Só no escuro. Nada de acrobacias eróticas. (...) Brigas entre o casal? A razão era sempre dele. (...) Em meados do século XX, continuava-se a acreditar que ser mãe e dona de casa era o destino natural da mulher. Já a iniciativa, a participação no mercado de trabalho, a força e o espírito de aventura definiam a masculinidade.

 A chegada maciça da pílula anticoncepcional às farmácias, na virada dos anos 60 para os 70, representou a antessala da chamada revolução sexual. Livre sa sífilis e ainda longe da aids, a jovem podia provar de tudo. (...) Carícias se generalizavam. Na cama, novidades. A sexualidade, graças aos avanços da higiene íntima, se estendia ao corpo inteiro. Preliminares ficaram mais longas. Na moda, a minissaia começou a despir os corpos. Lia-se Wilhelm Reich, para quem o nazismo resultou da falta de orgasmos. A ideia de que os casais, além de amar, deviam ser sexualmente equilibrados começava a ser discutida por algumas "prafrentex", como se dizia.

A imprensa da época revelava idas e vindas do "casal moderno". As reportagens anunciavam a necessidade de a mulher conhecer a sí mesma (e aos homens). (...) Havia ambiguidade em relação ao feminismo: se a mulher deixou de baixar a cabeça para passar a dizer "eu quero,eu posso,eu vou fazer",os primeiros sinais de desprezo pelo movimento não tardaram.

A imprensa feminina, reflexo natural da sociedade, continuou a investir na figura da mãe e da dona de casa. Só que, agora, angustiada. Questionada pelos filhos e ameaçada pelas mais jovens, seu horror era "ser trocada or duas de 20". (...) Início do século XXI: graças à pílula, o sexo não é mais uma questão moral, mas de bem-estar e prazer. O aumento dos divorcios não impede a mulher de recomeçar. Ocupando cada vez mais postos de trabalho, ela busca o equilibrio entre o público e o privado. Graças à independência financeira, ela não fica mais casada por conveniência, dividida entre o desejo de vários parceiros sexuais e a estabilidade necessária aos filhos. (...) Se a profissionalização trouxe independência, trouxe também stress e exaustão.

(...) A tirania da perfeição física empurrou a mulher não para a busca de uma identidade, mas de uma identificação. O nu, na mídia, despiu seu corpo,em público, banalizando-o. Uma estética voltada ao culto da boa forma, fonte de ansiedade e frustração, levou a melhor. (...) A mulher continua submissa. Agora não ao marido, mas à publicidade. E não há prisão pior do que aquela que não permite mudar nem envelhecer junto com o resto da população.

Nas últimas décadas, ela participou de outro movimento: o que separou a sexualidade, o casamento e o amor. Foi o momento de transição entre a tradição das avós e a sexualidade obrigatória das netas. Ninguém mais quer casar sem "se experimentar". Frigidez, nem pensar. "Ficar e se mandar"é a regra. E só se fala em "sexualidade plural". Separada da procriação, sem culpa, ancorada pela psicanálise e exaltada pela imprensa, a sexualidade da mulher brasileira se tornou assunto obrigatório. Tão obrigatório que chega a entediar. Resta perguntar quem vai lavar, passar e arrumar os tais lençóis macios da cama. Os historiadores de amanhã dirão.

Fonte: Revista Veja-Edição Especial Mulher - Ano 43-Veja 2166- Junho de 2010.
Parte integrante do texto de Mary Del Priore , historiadora , autora de História das Mulheres no Brasil.(Editora contexto)


No último domingo quando acabei de ler este texto na íntegra, resolvi de imediato que ele merecia destaque no blogger, mesmo que para não ficar muito extenso eu precisasse fazer uns recortes. Realmente a liberdade sexual da mulher é um assunto que vem sendo "discutido" amplamente, deixou a alcova e se tornou natural, por vezes até entediante como bem ressaltou Del Priori. A mulher brasileira lutou e ainda luta por igualdade  de direitos e na área sexual este fato ocorreu de modo meio desencontrado. Muitos irão pensar,por que uma mulher do séc XXI, independente, de atitude e  antenada em tudo que se passa com o comportamento humano está dizendo isso. Explico. A brasileira demorou muito para se livrar das amarras que a sociedade sempre às impos e quando conseguiu nem sempre foi bem interpretada ou soube lidar com essa mudança de atitude.

A pílula anticoncepcional trouxe para a mulher a opção de querer ou não ser mãe, o que antes ficava a cargo da natureza e das famosas "tabelinhas" que nossas mães tanto utilizaram (quantos bebês foram concebidos inadvertidamente por erros de cálculos...), agora havia sido transferido para os minúsculos comprimidos de hormônios. Um avanço claro..mas que anos mais tarde seria mal interpretado pelas adolescentes que acham que "pílula do dia seguinte" é bala e pode ser ingerida indiscriminadamente. Falta de informação?! Não. Falta de comunicação. As mães de hoje, por mais ousadas que sejam ainda não sabem conversar sobre sexo com suas filhas , nas camadas menos favorecidas então isso é ainda mais proeminente. A liberação sexual então entra num paradoxo, se por um lado é justo que  a mulher tenha o direito de escolher com quantos parceiros se relacionar, por outro a mesma sociedade machista e patriarcal ainda a rotula dos piores codinomes.

A publicidade ganha milhões com o público feminino, as campanhas de cosméticos, roupas e acessórios são as mais caras e também as que tem maior retorno financeiro para as empresas. Isso porque a mulher do séc XXI, tem que ser mãe, empresária, esposa e ainda estar linda e fatal para que não corra o risco de ser trocada por outra mais jovem e claro sem tantos afazeres . O culto a beleza chegou com sua força total e o que antes era vaidade, se torna uma obsessão para muitas mulheres e as doenças do séc são as tão famosas bulimias e anorexias.

Enfim, a mulher conquistou seu espaço, deixou de ser segundo plano no casamento (na maioria dos lares ao menos), liberou seu lado sexual na cama e fora dela, mas ao contrário que muitos pensam, o que ela busca não são conversas e mais conversas  a este respeito, como se fosse algo inusitado essa revolução feminina, a maioria delas está quer ser respeitada, poder fazer suas escolhas sem julgamentos. Se essas mudanças  vierem acompanhadas de algumas acrobacias dignas do Kama Sutra, feliz é o homem escolhido para fazer parte da história dessa mulher.  

Márcia Canêdo

By JORNALISMO ANTENADO with 18 comments

18 comentários:

Ahahahahah bem que imaginava ter lido isso, eu tenho a Veja e adorei a Edição Mulher.

Minha opinião masculina a respeito.
A mulher de hoje é escrava daquilo que a mídia prega como sendo bonito, no final das contas, vejo mulheres infelizes por não serem tão magrelas quanto aquela modelo, que de tão magra, me parecem doentes, desfilando gramorosamente suas olheiras e os ossos bem definidos sob a pele fina.
O consumismo consome muitas mulheres, que trocam sua felicidade por uma boa tarde de compras em um shoping qualquer da cidade.
A liberdade sexual trouxe também uma guerra declarada entre as mulheres, que competem entre sí hoje, muito mais que em anos atrás.
Acredito que a vitória real e definitiva virá quando as mulheres aprenderem que são gostosas, independente da forma estar ou não igual a daquela personagem da novela; que tem encantos própios e não precisam querer copiar aquela mesma personagem.
Quando a mulher se olhar no espelho e disser, "eu sou mais eu", aí sim, a felicidade estará conquistada.
Nós homens amamos vocês, independente da cor, forma, tamanho, condição.
E os poucos machistas que restaram, merecem a solidão, ou no maximo, o aconchego de um copo.
Um grande abraço
Giba

Márcia,

Eu sempre considerei que a posição de "céu" e "inferno" não era a do primeiro encima e o segundo embaixo. Sim, o paraíso no meio (equilíbrio) e as Trevas nos extremos (carência ou escesso).

Incrível como passamos de um aoutro extremo de sofrimento por apenas um pulo. Nem nos damos conta (muitas vezes, não queremos mesmo) que o equilíbrio constitui a felicidade e a conservação de nossa individualidade, sem perdermos os rumos.

De uma vez, o ser humano de racional enjaulado passa a fera liberta. Em nenhum dos casos, a fera e o ser pensante se encontra, em nenhum dos extremos os veremos reconciliados. Os efeitos de uma privação horrenda sempre se esgotam num excesso báquico, orgíaco, animalesco. os limites do alcance do huma-nimal se extendem, tanto em direção à Divindade como para a Besta.

Ótima escolha de texto!!

BJs!

Eu acho que o equilíbrio é fundamental em tudo na vida .
A mulher viveu a época da exclusão social e sexual , depois veio a época da libertação e hoje vivo o outro extremo , se libertou demais . Agora está na hora de se ajustar .

bjs♥
Francisco

Márcia,

Esse "mas..." no título é semelhante aos outros que aparecem sempre que a "palestra", "discurso", "notícia" é sexo ou sobre ele.

Esse "mas..." é também um lero-lero, um tédio, um problema cultural, de cabeça e, claro, da sociedade machista (e aí penso que algumas mães são demasiadamente machistas: "filha, você tem que fazer o seu marido feliz!"). Desde que ela também seja feliz, se realize, se satisfaça sexualmente, tudo bem.

A notícia é oportuna, interessante, e antenada como você só, não podia deixar passar "batido".

Digno de aplauso o último parágrafo, no que tange a "chega de conversa".

O sexo é uma dádiva divina para ser desfrutado em i-g-u-a-l-d-a-d-e. E, aí, realmente há felicidade.

Abraço do amigo,

Antonio

Olá!
O maior diferencial da mulher é a gestação e por isto por tanto tempo fomos segregadas por medo desta força;
Linda postagem
Meu carinho

Oi Marcia,

Muito bom texto, inteligente e digno de uma mulher que sabe o que faz e o que quer.

Mandou bem, parabéns e bjs
Bruno

TWITTER: @brunobezerra

Olá querida Márcia,

O Mundo ainda é machista, e pior de tudo, as mulheres são machistas!

São escravas da mídia e da religião, mesmo que indiretamente.

Hoje em dia continua valendo o mesmo conceito imbecil e machista: Homem que transa com várias mulheres: Gostosão, Garanhão, o Bão! - Mulher que transa com vários homens: Biscata, Puta, Vadia - ACORDA BRASIL!

Chega de machismo!

Deixem as mulheres serem felizes!

Sexo é sexo e amor é amor!

è possível fazer sexo com amor, mas jamais confundir sexo com amor! É ridículo quando alguém diz: "vou fazer amor".

Todas as pessoas devem ser livres (sem culpas) para fazerem sexo pelo motivo que quiserem, seja por prazer, tesão, por amor, ou só mesmo para satisfazer uma necessidade fisiológica humana.

Penso que o que é importante no sexo é que sempre todos os envolvidos sintam-se satisfeitos e respeitados.

Grande Abraço;
Lauro Daniel

Márcia,
amiga, tem um selinho pra você lá no meu blog, postei hoje (30/05). Passa lá pra pegar. Espero que goste.
Concordo com o comentário do amigo Ebrael acho que no final das contas o que pesa mesmo é o equilíbrio.

Beijão no seu coração, bom domingão e fica com Deus

Marcia
Excelente sua escolha do texto.
A mulher lutou muito pela sua independencia...ganhou algumas coisas positivas :ter os mesmos direitos que os homens;e outras negativas:ter que sair para trabalhar e deixar os filhos em mãos de outros...
bjs
joana

olá Márcia!
muito interessante o poste.
realmente é real a mudança da mulher.
Elas estão alcançando o espaço, independência financeira,etc.
mas uma coisa eu falo, algumas mulheres não tem a ajuda e o companheirismo do esposo nas atividades caseiras, portanto existe mulheres que trabalham quase o 24:00 horas por dia, para manter o trabalho externo no qual ela está inserida e a familia em casa.

beijos.

Márcia, excelente matéria...

e nos mostra como é inportante sabermos os dilemas e ganhos da mulher brasileira.

Abraço.

Oi Márcia! Não pude deixar de lembrar que nos anos 40, Freud disse que a mulher não era santa, que tinha desejos como o homem, e foi crucificado por isso. O psicanalista fez tais afirmações com base num profundo estudo sobre a influência dos mitos religiosos. Ele usou o termo santa porque a religião associada à maternidade desproveu a mulher da sexualidade ao olhar masculino, tornando-a quase intocável. Sexo com a mulher era p a procriação e o prazer era com as prostitutas. Acredita-se q esse pensamento permaneça enraizado no inconsciente masculino.
Ainda há um bom caminho a percorrer.

Olá Márcia!
Estava com saudades de vir aqui. Muito bom este texto! Daria "pano pra manga",né amiga? Gostei muito dos seus comentários,logo em seguida.Você tem razão, não é fácil a liberdade, em alguns setores, pois toda liberdade traz responsabilidades tambéme a mulher tem que lutar muito ainda contra o preconceito.
Como estava num extremo, o efeito pêndulo se fez sentir..foi para o outro extremo, assim que liberta. É comum isto. Chegaremos ao equilíbrio...ou quase...porque, sempre teremos a gestação e também o fato de sermos mães, como fator difícil de resolver, uma vez que, só combinaria com a liberdade sexual e iguais direitos, se houvesse outros apoios dados às mulheres mães ( como creches, ajuda aos filhos,etc..)
Bem, gostei muito. e, só mais uma coisa, William Reich foi muito importante por falar de sexo e prazer de uma forma mais livre e realista, eu acho. E sexo, só mesmo quando ambos podem se colocar em igualdade, neste momento. aí é tudo de bom. Há casamentos que não se desfazem porque, o casal consegue neste assunto, se realizar em igualdade, mais do que fora do quarto!
Beijo,Vera.

Olá Marcia, você tem razão, esta matéria é muito boa, a mulher está buscando cada vês mais seu espaço, tem que ser guerreira mesmo. Ainda existe o preconceito, de muitas formas até. A própria midia retrata a mulher de forma fácil, comum. No entanto ela é especial, com certeza.
Eu tenho um casamento de 18 anos, e vivo maravilhosamente bem com minha esposa. Admiro mulheres que buscam seu espaço, com dignidade e claro, decisão.
um grande abraço,

Herminio Neves.

"No fundo (...) o mundo é feito para terminar num belo livro" Stéphane Mallarmé

Márcia, foi uma revolução em duas vertentes. Duas intencionalidades. Da mulher sempre sufocada pelo mundo machista e de uma abertura de certa forma programada e abraçada pela mídia. Mas a verdadeira revolução foi silenciosa, interna, dentro de cada mulher que foi ocupando os espaços externos criados. Mas dentro dela própria foi se criando um poço. Se a mulher consegue perceber a sua verdadeira liberdade, de escolher, de se colocar diante de tudo que lhe é oferecido, vemos uma mulher completa. Se sucumbe diante dos modismos insanos e inconsequentes, têmo-la mais escrava do que antes.
E é tão lindo o sorriso de uma mulher realmente livre que sabe que não tem limites e por isso se coloca como deseja. E é no desejo que se coloca toda a sociedade.
Na criação de novos, na consumação dos antigos.
Um abraço!

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